Metamorfose

“Às vezes dou comigo a pensar que saltei no tempo,
Aquilo não aconteceu comigo.”
Aquilo…
Aquilo é uma doença.
Aquilo é uma vida sem o outro.
Aquilo é uma tragédia que nos cai em cima.
Aquilo é uma mudança brutal.
Uma Metamorfose

O sofrimento é um casulo obrigatório.

Ia eu pela rua quando pessoas, gente desconhecida que passava naquele local naquele momento, se abraçou a mim, todos se abraçaram a mim, não um de cada vez, mas todos ao mesmo tempo. Eu deixei, n os afastei, e eles abraçaram-se e choraram de forma sentida, com o choro atroz de quem sente o sofrimento de um familiar próximo. E continuaram assim abraçados até necessitarem das mãos para limpar as lágrimas e o ranho que lhes escorria na cara.
E como vieram assim se foram, ainda fungando, ainda limpando o ranho e as lágrimas, olhando o Sol com outro entusiasmo, sentindo o vento na cara, não como uma maldição, mas como uma bênção, sentimento próprio de quem está vivo.

Há vezes em que sinto ainda, como os amputados sentem as pernas e os braços que perderam, é como se lá estivesse, mas não está. Perdeu-se para sempre. Sinto o doce sabor da normalidade do dia a dia, com os seus problemas e as suas agitações, e o cansaço pesado da noite, o cansaço que traz o sono, e o depois do sono, e o acordar fresco da manhã, mas já não está lá, só lá está o desespero de o reencontrar. Devia ser Fevereiro, era de certeza Fevereiro, lembro-me das magnólias floridas.


Alberto Baptista