VÍTOR
Vítor é o nome fictício de um jovem que convém ficar anónimo. Mãe e pai mortos por overdose, a mãe quando ele tinha apenas três anos, o pai há menos de dois anos, no dia em que Vítor completava catorze. Não conheceu outra família, os vizinhos da ilha onde vivia, principalmente a D. Berta, ajudaram o menino a criar-se como já tinham ajudado no tempo em que o pai era vivo.
Apesar da história trágica, Vítor não era, nem nunca foi um menino triste. O rapaz era feito de um sorriso franco, saudável e jovial que mostrava brilhos faiscantes de uns olhos azuis marinhos e de uma dentadura perfeita. O cabelo negro carvão contrastava com a pele de uma claridade marfim, todos os músculos eram bem desenhados, bem proporcionados. Quando ele passava o “mundo inteirinho se enchia de graça”, se um dia um compositor se cruzasse com ele de certeza que alguma música surgiria, nem que o título tivesse que ser – o rapaz da ilha.
Vítor trabalhava na cozinha de um grande café do centro da cidade, já fora despedido por “mandriar”, como afirmara o sócio gerente, mas foi o próprio sócio gerente que de novo o fora buscar à ilha sem dar muitas explicações, todos no café sabiam a razão – a única forma de conter nos seus empregos mal pagos, tanto homens como mulheres, era o ar de festa criado pelas constantes brincadeiras e tropelias do Vítor em todo o espaço que o rodeava – o trabalho era demasiado pesado e mal pago para aguentar muito tempo sem essa benesse. Para o sócio gerente o erro de o despedir nunca mais se repetiria. Vítor funcionava como um bálsamo, e mesmo que o seu trabalho não contribuísse muito, o seu salário ridículo não era propriamente um grande prejuízo.
Aos Domingos a baixa da cidade estava mais vazia que os bairros suburbanos durante a semana, a folga era ao Domingo e à Segunda-feira. Às dez horas de Sábado já Vítor corria para a sua casa, tomava banho, vestia-se a condizer e ala que se faz tarde.
Ás onze e meia já era possível ver, dentro de uma camisola bem garrida, a passear para baixo e para cima em Sá da Bandeira naquela que se tornara a sua segunda profissão – acompanhante masculino, ou seja – prostituto, ou como a D. Berta gostava de dizer – faz pela vida.
Fazer pela vida impedia-o de ser perseguido quando era óbvio que havia sexo entre homens, como não era amaricado, fazer pela vida era a única forma de ser aceite entre semelhantes. Fazer pela vida acabava por ser uma frase feita que implicava a interdição a mais perguntas, o tabu estava aberto com esta frase mágica.
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